Assim que termina um clássico, logo se inicia um jogo de identificação 
de culpados pelo resultado: o treinador que leu mal a partida; o central
 que claudicou no momento-chave; as substituições feitas a destempo. 
Pouco importa: quando se perde há sempre uma responsabilidade 
individual.
Chegados a terça-feira, as responsabilidades na 
derrota do Benfica já foram escalpelizadas, mas, desculpem-me o 
egocentrismo, houve uma que ainda não vi mencionada. A culpa foi minha. 
Isso mesmo, o Benfica perdeu por minha causa. A razão é simples – não 
estive no estádio a apoiar a equipa.
Tenho justificações.Numa 
daquelas excentricidades do futebol português, o jogo foi marcado em 
cima da hora para uma obtusa sexta-feira à noite. Com bilhetes na mão 
para um concerto do jovem talento do saxofone Ricardo Toscano, fui 
impelido a trocar o meu Red Pass pelo jazz. Os resultados são os 
conhecidos. Enquanto me deixava levar pelo fraseado de pendor clássico 
de Toscano, o Benfica perdia. 
Se me responsabilizo pela derrota,
 não quero que vejam nisto nenhum misticismo ou superstição. A 
explicação é outra. Sendo o futebol uma coreografia de solos, ainda que 
assente no coletivo (lá está, o paralelismo com o jazz), o bom 
desempenho da equipa depende da audiência. O Benfica existe enquanto 
prolongamento dos adeptos na bancada e se um de nós falha, é como se 
toda a organização ruísse. Desta vez, foram a minha voz e o meu 
sofrimento a faltarem no estádio – o que estou convencido fez toda a 
diferença. Mas não se apoquentem, hoje estarei na Luz a empurrar a 
equipa para a frente.
publicado no Record de hoje