O segredo de justiça tornou-se o espelho da justiça em Portugal. É violado quotidianamente, com benefício do infractor. Entre a impunidade de uns e a impotência de outros, resta um sistema desacreditado e que procura a credibilidade perdida numa gestão a conta -gotas da informação que vai passando para a comunicação social. A procuradora-geral- adjunta, Cândida Almeida, veio, esta semana, lembrar o óbvio: o rei vai nu e para que ele possa ser de novo vestido é necessário, por um lado, aumentar as penas dos prevaricadores e, por outro, admitir que também os magistrados são possíveis violadores do segredo. Logo, também eles poderiam ser escutados para apurar a verdade. A proposta parece absurda, mas convenhamos que é compatível com o papel omnipresente que as escutas têm vindo a revelar na investigação judicial. Não demorou muito para que o sindicato dos magistrados do Ministério Público viesse, com a costumeira indignação, recusar-se a aceitar que os magistrados possam ser responsáveis pela violação; posição prontamente acompanhada pelo secretário de Estado da Justiça, que suspendeu funções para se pronunciar enquanto advogado (!), recusando-se a aceitar que um magistrado seja "presumivelmente o infractor". Partindo do princípio de que as violações do segredo de justiça não são obra do divino Espírito Santo, que os senhores magistrados foram "ungidos" no CEJ e, portanto, estão acima de qualquer suspeita, a malha aperta-se e não restam muitos presumíveis infractores. É por isso estranho que raramente haja condenações.
publicado hoje no i.