"I hope the fences we mended
Fall down beneath their own weight"

John Darnielle

padaoesilva@gmail.com

sexta-feira, 30 de março de 2012

Homens em tempos sombrios

quarta-feira, 28 de março de 2012

um exemplo de manual escolar

"Quando precisar de um exemplo do estado de degradação a que chegou o debate político em Portugal, não terei grandes hesitações. Escolherei a discussão em torno da Parque Escolar. É difícil encontrar outro caso tão paradigmático da pulsão a que os governos não resistem para diabolizar o que foi feito pelos seus antecessores, combinada com incapacidade de escrutínio por parte da comunicação social, e que culmina numa timidez exasperante da oposição na defesa do seu próprio legado. Um trágico retrato do país político. (...)"
o resto do meu artigo do Expresso de 17 de Março pode ser lido aqui.

segunda-feira, 26 de março de 2012

Amigos em Portugal

A notícia tem já vários meses, mas só agora me chegou: Vini Reilly, a alma dos Durutti Column, sofreu um AVC que o limitou fisicamente. Se bem que já tenha voltado a tocar e, inclusivamente, a compor, é ainda incerto se recuperará totalmente.
Uma das bandas mais importantes da Factory Records (na verdade, a primeira a “assinar” com Tony Wilson), os Durutti Column foram responsáveis por alguns dos discos mais singulares da década de oitenta. The Return of the Durutti Column, LC, Another Setting e Circuses and Bread são, ainda hoje, álbuns parcimoniosos, mas assentes numa complexidade que encontra poucos ou nenhuns paralelos na cena pós-punk britânica. O dedilhar único da guitarra de Vini Reilly, a fragilidade da sua voz, usada apenas a espaços, e a bateria de Bruce Mitchell deixavam o campo aberto para sonhos bucólicos. Acima de tudo, pairava uma capacidade melódica presa a ambientes capazes de, por vezes, ofuscar toda a tristeza que encerrava aquela música. Quando as músicas dos Durutti Column se entranham, nunca mais nos podemos sentir abandonados. Sobre a banda, Miguel Esteves Cardoso escreveu, já lá vão quase trinta anos: “esta música não é uma coisa prosaica e ingénua; não é papel-de-parede para tapar os buracos verdadeiros. Aqui há também uma luta. O que é preciso é raspar levemente a superfície da pintura, para encontrar a sua base de tintas negras e feias, o seu medonho inconsciente. Não há beleza sem contraponto, nem harmonia sem contraste. E a música de Vini Reilly é só isso.” É mesmo só isso.



A versão ao vivo da Jacqueline que aqui se vê (de 1988) é superior à versão mais curta do LC (ou da LC). Aliás, o tema sempre ganhou em versões ao vivo, com o solo do Bruce Mitchell (tão impressionante como a sua expressividade) a criar o contexto certo para que a guitarra volte a cair no tema.

texto também publicado aqui.

quinta-feira, 22 de março de 2012

Zona de conforto

Há um par de semanas, passei a fazer um programa de música na antena da TSF. Chama-se Zona de Conforto e vai para o ar, semanalmente, nas madrugadas de sexta para sábado, entre a meia-noite e a uma da manhã. O programa tem também um blog - onde, entre outras coisas, é possível ouvir as emissões anteriores (fazendo scroll down na página, encontram o link do lado direito). São todos muito bem vindos.

quarta-feira, 21 de março de 2012

Banhos de Mar, no dia da morte de Tonino Guerra



Há um par de anos, tive o privilégio de jantar em Lisboa com Tonino Guerra, poeta, argumentista e co-responsável pela criação do universo que atribuímos exclusivamente a Fellini. Durante um fim de tarde e noite, partilhei, com não mais de vinte pessoas, as palavras de um contador de histórias admirável, que aos oitenta e muitos anos mantinha os olhos vivos de quem vive numa infância exuberantemente reinventada – como aquela que se vê no Amarcord de Fellini e Guerra. Sei que guardarei muitas das palavras simples ditas por Tonino Guerra. Mas, de tudo o que ouvi, há uma lição de que não me esqueço e que arrisco citar de cor: “Os adultos têm sempre as mãos limpas. Eu tenho oitenta anos e lavo-as muitas vezes ao dia. Mas só quando as tenho sujas me recordo de quando era criança”.
Não pude deixar de me recordar de Tonino Guerra ao ler recentemente um pequeno e espantoso texto da escritora brasileira, Clarice Lispector, Banhos de Mar. Aquilo que para Tonino são “as mãos sujas”, são para Lispector “os banhos de mar”: metáforas para um regresso a um paraíso perdido, a uma infância absoluta de sensações e à qual somos capazes de regressar, num caso, através da sujidade das brincadeiras, noutro, com os mergulhos no mar e o cheiro a sal no corpo. “Somos crianças feitas para grandes férias”, escreveu Ruy Belo num dos mais magníficos poemas em língua portuguesa (A orla marítima). É essa a nossa natureza: buscar incessantemente a felicidade num feixe de luz que nos transporta para um passado que até pode não ter existido como o vemos hoje. Pouco importa. É esse passado, rescrito e reinventado, que recordamos. O correr dos tempos intensifica esse retorno difuso às sensações de quando estávamos crianças, surpreendidos com a descoberta. O sentimento tende a agravar-se com a chegada dos filhos, quando, ao olharmos para eles, vemos nos seus sorrisos deslumbrantes a nossa própria felicidade.
Clarice Lispector conduz-nos com palavras doces para uma infância de tranquilidade, feita de banhos madrugadores no mar do Recife, levada pela mão do pai: “O mar de Olinda era muito iodado e salgado. E eu fazia o que no futuro sempre iria fazer: com as mãos em concha, eu as mergulhava nas águas e trazia um pouco de mar até minha boca: eu bebia diariamente o mar, de tal modo queria me unir a ele”. O lugar era onde a felicidade começava e tudo era assombrosamente novo: “essa viagem diária me tornava uma criança completa de alegria. E me serviu como promessa de felicidade para o futuro”. A impressão táctil desse passado resistiu, a roupa e os cabelos impregnados de sal que iam secando no regresso a casa. E, no fim, uma crença que ficou para a vida, que era também a partilha de um léxico familiar: “meu pai acreditava que não se devia tomar logo banho de água doce: o mar devia ficar na nossa pele por algumas horas. Era contra a minha vontade que eu tomava um chuveiro que me deixava límpida e sem o mar”.
Leio e releio o texto de Clarice Lispector e quase que sinto o cheiro da infância – a t-shirt que se colava ao corpo com o sal que a costa atlântica portuguesa nos dá em doses generosas; as noites bem dormidas; os dias feitos de mergulhos e carreirinhas infindáveis nas ondas de verão que pareciam maiores do que realmente eram; as correrias; o bicicletar sem rumo; e mais tarde os primeiros take-offs, partilhados com um par de amigos. Tudo se torna nítido, como é próprio dos prazeres iniciais.
Mas o texto de Clarice tem um tom sombrio no final, a impossibilidade de regressar a esses tempos de banhos de mar: “A quem devo pedir que na minha vida se repita a felicidade? Como sentir com a frescura da inocência o sol vermelho se levantar? Nunca mais? Nunca mais. Nunca.”
Pois eu sei como se reencontra esse tempo. Pego na prancha, remo para o outside e, mesmo que não sorria como faz o meu filho, em cada onda que apanho fico perto do seu mundo fácil. É também para isso que serve o surf, para recuarmos ao tempo da ingenuidade, às suas sensações, aos seus prazeres e à sua libertinagem. Dentro de água tudo o resto desaparece e podemos beber, nas ondas, o mar. Depois, no regresso à Terra, o peso delicado do sal no corpo ajuda a sedimentar a memória da infância.

texto publicado em 2007 na SurfPortugal e entretanto editado no "Sal na Terra".

terça-feira, 20 de março de 2012

Faça-se ao lado

"(...)como a realidade tem muita força, os problemas não poderiam deixar de surgir e passou a ser necessário lidar com eles. E, neste aspecto, o primeiro-ministro não hesitou e, parafraseando-o, “recuperou velhos comportamentos preguiçosos”. Santos Pereira é incapaz de gerir as relações com os parceiros sociais? encontra-se um negociador fora do governo; Santos Pereira é incapaz de dar conta da internacionalização da economia? entrega-se a matéria aos Negócios Estrangeiros; Santos Pereira é incapaz de acompanhar as privatizações? convida-se uma figura de prestígio para acompanhar o processo; Santos Pereira é incapaz de responder ao flagelo do desemprego juvenil? forma-se uma comissão presidida por outro ministro; Santos Pereira é um empecilho para a execução dos fundos comunitários? institui-se uma “comissão chapéu”, coordenada por um colega de governo. No fundo, o primeiro-ministro optou pela solução simples. Santos Pereira não tem competências políticas? o Ministério é ingovernável? recorra-se ao velho: “faça-se ao lado”.
Perante este cenário, não há, como bem referiu Passos Coelho, desmantelamento dos ministérios. De facto, a orgânica do governo mantém-se inalterada – e, aliás, por concluir. Há, contudo, uma outra coisa, bem pior: do ponto de vista institucional, fica tudo na mesma, mas criam-se estruturas paralelas, escassamente formalizadas e menos sujeitas ao escrutínio político (desde logo do parlamento), para compensar a inoperância da estrutura orgânica existente. É um procedimento habitual no Estado português e que tem dado contributos bastante negativos para a implementação das políticas públicas. Aliás, pode bem dar-se o caso de estarmos como estamos, não por força de opções substantivas erradas dos sucessivos governos, mas como consequência de práticas institucionais contraproducentes. A história do Álvaro é, no fundo, mais um episódio de uma trajectória de degradação do Estado.

a versão integral do meu artigo do Expresso de 10 de Março pode ser lida aqui.

quinta-feira, 15 de março de 2012

We're all strangers here


como diria o Álvaro, "tão bom que nem parece português".

quarta-feira, 14 de março de 2012

No fundo, não importa nem o tempo, nem o lugar, é isto

Why I Am Leaving Goldman Sachs
"(...) My proudest moments in life — getting a full scholarship to go from South Africa to Stanford University, being selected as a Rhodes Scholar national finalist, winning a bronze medal for table tennis at the Maccabiah Games in Israel, known as the Jewish Olympics — have all come through hard work, with no shortcuts. Goldman Sachs today has become too much about shortcuts and not enough about achievement. It just doesn’t feel right to me anymore.(...)"
um artigo que deve (tem de) ser lido na integralidade, aqui.

segunda-feira, 12 de março de 2012

Um Estado Sindical

"(...)A natureza do que é dito pelos responsáveis sindicais do Ministério Público já não surpreende, acontece que passou a ser tolerada. Parece-me que há boas razões para ficarmos preocupados. Estamos perante uma pulsão que visa contrariar os equilíbrios de poder no regime e, em última análise, condicionar a acção dos poderes executivo e legislativo. Não é nada de novo, convenhamos, e a ambição é clara: o que antes acontecia através de coligações entre péssimas investigações judiciais e mau jornalismo, com acusações na praça pública, assentes em violações selectivas ao segredo de justiça, tem, agora, de ser institucionalizado. (...)
Neste contexto, é particularmente preocupante a complacência da actual ministra em relação ao conjunto de poderes fácticos que vai ganhando espaço na justiça. Uma complacência que não encontra paralelo em nenhum governo anterior, independentemente da cor política. Quando o que era necessário era um alargamento do espaço de influência do Ministério da Justiça, através de acordos parlamentares e envolvendo o Presidente da República, o que assistimos é uma opção que rompe com essa tradição e procura sustentação política nas organizações sindicais do sector. Não são necessários grandes poderes de previsão para antecipar que este namoro acabará mal. Até lá, vai sendo alimentado o sonho de ter no topo da hierarquia do MP um procurador escolhido pelos seus pares. Pior que um Estado corporativo, só mesmo um Estado sindical."
a versão integral do meu artigo do Expresso de 3 de Março está aqui.

quarta-feira, 7 de março de 2012

Zona de conforto

segunda-feira, 5 de março de 2012

Suicídio assistido

"Acabar com o Carnaval ou com feriados não nos torna melhores trabalhadores. A menos que o desígnio estratégico seja a chinização do mercado de trabalho, o que Portugal precisa é de gestores que administrem melhor, de alterar o padrão de especialização da nossa economia (em lugar de aprofundarmos as suas debilidades, que é, de facto, a consequência da estratégia de empobrecimento) e continuar a investir na qualificação (em vez de, por exemplo, desmantelar as “novas oportunidades”). Uma evidência, menos para o Governo, que insiste na ideia de que a resposta aos problemas da economia política portuguesa passa por trabalharmos mais horas.
A estratégia é reveladora de uma incompreensão do momento que vivemos. O que enfrentamos é uma crise da procura – ainda esta semana, por exemplo, soube-se que as indústrias portuguesas estão entre as que registaram uma maior queda nas encomendas recebidas. Ou seja, a capacidade utilizada da economia está em mínimos, logo, se continuamos a insistir no aumento do número de horas de trabalho, não escaparemos a um crescimento ainda maior do desemprego.
Há dias, o primeiro-ministro espanhol, Rajoy, considerou um suicídio a diminuição do défice a que a Espanha estava obrigada este ano (de 8% para 4.4%). É difícil encontrar outra expressão que descreva de modo tão exacto o que se está a passar em Portugal. Uma contracção da economia que vai para além do razoável e que, acompanhada pela insistência no aumento de número de horas de trabalho, vai ter um efeito devastador sobre o emprego. Estamos perante um suicídio provocado pelo governo português, mas assistido pelas obsessões ideológicas da troika."
a versão integral do meu artigo do Expresso da semana passada está aqui.

domingo, 4 de março de 2012

Zona de conforto

sexta-feira, 2 de março de 2012

Regresso à normalidade

Nos cinco minutos em que não se queixam de pressões políticas ou do modo como os cortes nas remunerações podem colocar em causa a sua independência, os magistrados do ministério público aproveitaram para organizar um congresso que começou hoje. O site merece bem uma visita. Para além de um número alargado de media partners (não sei se, por exemplo, no congresso do PSD que se realiza no próximo mês também existirão media partners), é também supreendente o número de instituições bancárias que patrocina a iniciativa (quatro mais uma seguradora). O Público, ao menos, assume que viajou pago pelo sindicato. Imaginem se a ideia faz escola.

e o Porto aqui tão perto

quinta-feira, 1 de março de 2012

A modo mio avrei bisogno di sognare anch'io.


Morreu o Lucio Dalla e eu não posso deixar de sentir saudades do país com as praças mais bonitas do mundo. Entre elas esta de Bolonha.