"I hope the fences we mended
Fall down beneath their own weight"

John Darnielle

padaoesilva@gmail.com

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

Gratidão, Luisão





Imagine que tem 35 anos, foi titular indiscutível durante mais de uma dezena de temporadas, acaba de terminar um ano em que jogou pouco e a sua equipa sagrou-se campeã nacional com um jogador dez anos mais novo na sua posição. Agora acrescente que, durante o defeso, foi visto como sendo dispensável, empurrado para um colosso das West Midlands, de nome curioso, que se arrasta por um campeonato secundário, mas que estava disponível para lhe pagar um salário exorbitante. Contra a vontade de muitos, que olhavam para a sua saída com alívio, ficou. Mas a história não termina assim. Como se não fosse suficiente, no início da época as lesões arreliadoras não o abandonavam e perdeu a titularidade. A custo, aproveitou a oportunidade e regressou ao seu posto na defesa e na equipa.

Em catorze temporadas de águia ao peito, poucas coisas dão tão bem conta da fibra de que é feito Luisão como o que se passou nos últimos meses. De jogador proscrito por muitos a titular aos 36 anos e à beira de completar, hoje, 500 jogos oficiais pelo Glorioso. Os números são de outro tempo, quando os jogadores estavam amarrados a um só clube, mas o que mais destoa é a força mental para recusar o fim da relação com o Benfica.

É este o nosso capitão. Um Luisão que já não terá as qualidades do passado, mas dá outras coisas fundamentais à equipa. Se hoje o Benfica está sempre mais próximo das vitórias, deve-o também a um jogador que, num plantel repleto de talento, mas, também, muito jovem, oferece um suplemento de maturidade e liderança para compensar a inexperiência.

"Gratidão" é de facto a palavra exata.

publicado no Record de 14 de fevereiro

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

Em busca de um 8

Nas últimas semanas desenvolveu-se um consenso: o problema do Benfica era a baixa de forma de Pizzi. Logo, era necessário ter uma alternativa para a posição 8. Registo que esta discussão tem anos, tendo-se acentuado desde a saída de Enzo.

Deixando de lado o facto do próprio Enzo ser uma adaptação, já quando o argentino saiu, o Benfica teve dificuldade em arranjar uma solução e desviou Pizzi para o meio. Depois, com Vitória, a equipa passou um par de meses com o mesmo problema. Foi então que Renato surgiu, encheu o campo, e com Pizzi a descair para a ala, a equipa reequilibrou-se rumo ao 35. Este ano, a história repetiu-se e passou a ser necessário substituir Renato.

Contra as expetativas, a temporada iniciou-se com Horta a titular. Entretanto, a vaga de lesões devolveu Pizzi ao meio. Meses passados, com o transmontano a acumular jogos nas pernas, os problemas ressurgiram porque, é sugerido, Pizzi não pôde descansar.

E se o problema for outro? É que, de facto, não há muitos jogadores para jogar a 8 num meio-campo a dois (a posição é muito exigente técnica, tática e fisicamente) e aqueles que o conseguem fazer rapidamente serão vendidos (os colossos europeus não andam a dormir). Mais, quantas equipas europeias de topo jogam com o sistema do Benfica? Nenhuma.

Conclusão: como um 8 como o Benfica necessita para o sistema que usa é uma espécie rara, estaremos sempre à procura de um jogador para a posição. Que fazer? talvez pensar num sistema alternativo, com um meio-campo a três e que não peça tanto de um jogador difícil de encontrar.

publicado no Record de 7 de Fevereiro

Sem Frescura

Na flash interview, Arnaldo Teixeira afirmava que "no Benfica somos conscientes, sabemos, desde o princípio da época, que o campeonato vai ser longo, difícil. Vai ter luta até ao último segundo da última jornada". É um facto, mas convém não tornar o caminho ainda mais difícil.

O que aconteceu no Bonfim não foi propriamente uma surpresa. O resultado vinha sendo anunciado nas últimas semanas. Depois de Guimarães, a equipa foi perdendo frescura física e anímica e, pelo caminho, foi diminuindo o discernimento. Sem Grimaldo, com Nélson menos disponível e agora sem Guedes, o Benfica fica com menos profundidade e sem aceleração. Ao mesmo tempo, no meio – onde está sempre a raiz de todos os problemas e de todas as soluções – a equipa passou a ter menos critério e o jogo foi ficando crescentemente atabalhoado, ao ponto de, ontem, praticamente não terem sido criadas oportunidades flagrantes.

Uma vez mais, ficou demonstrado que a sorte e o azar, no futebol, contam menos do que se pensa. Podemos bem, com justiça, queixarmo-nos de um penálti incrível que ficou por marcar ou lamentarmo-nos da fortuna do Setúbal que, com uma única oportunidade, venceu o jogo. A questão, contudo, é outra. Num momento de menor frescura, o Benfica precisa de ter um processo coletivo mais sólido quando se vê em desvantagem, em lugar de apostar, como tem acontecido, na muita qualidade individual dos seus jogadores e nesta opção estranha de ir acrescentando avançados e extremos à medida que os minutos vão passando.

Agora, há que olhar para a frente, mas convém atentar retrospectivamente no que tem corrido mal.

publicado no Record de 30 de Janeiro