segunda-feira, 28 de março de 2011
Dylanesco
Há quatro tipos de relação com os Mountain Goats: desconhecimento (“quem?”); indiferença (“não vejo nada de especial nestes gajos”); irritação (“este gajo tem uma voz insuportável e não sabe cantar”) e depois há os die-hard fans. Aqueles que, quando os ouvem, sentem-se os miúdos que tiveram um banda de death metal em denton (nunca tendo gostado do género ou estado em denton), que julgam ter feito parte de um casal disfuncional de alcoólicos (nunca tendo sido um casal ou disfuncional), que experimentam ter passado por uma cura de desintoxicação por metadona (não sabendo o que é intoxicação), que encontram salvação na bíblia (desconhecendo a diferença entre o antigo e o novo testamento). Darnielle, um pouco como Dylan, conta histórias nas canções e como acontecia com as histórias de Dylan, por mais improvável que possa parecer, nós pensamos ser os protagonistas. (nunca tinha pensado nisto, mas dylanesco é o qualificativo mais adequado - gosto muito da palavra dylanesco).
Mas mesmo um ‘die-hard fan’ tem dificuldade em acompanhar a produção de John Darnielle: um número sem fim de álbuns (ninguém sabe exactamente quantos), de colaborações, projectos paralelos, torna o completismo uma tarefa impossível. Há quem diga que Darnielle publicou mais de 500 canções. É bem provável que assim seja. Mas há uma outra linha divisória, esta entre os ‘die-hard’. Há quem tenha abandonado os Mountain Goats quando passaram a ser uma banda que grava discos, com uma produção minimamente cuidada, em lugar de Darnielle soprar canções em catadupa para um gravador caseiro. E há quem goste deles como banda, com músculo em palco, com guitarras, baixo e bateria, por cima da ironia ácida, que continua lá, e que nem por isso ficou mais escondida. Os últimos discos, na verdade desde que assinaram com a 4AD, são álbuns de uma banda. Mas onde imagino que a diferença se faça sentir é mesmo ao vivo. Vi duas vezes os Mountain Goats (uma há 3 anos, no lançamento de Herectic Pride) e na sexta-feira passada. Ao vivo, só os conheço como banda. E não percebo como é que se pode não gostar. Quem discordar, escusa de regressar aqui.
Quanto ao concerto, telegraficamente (e para os 3 ou 4 que se possam interessar), tocaram o ‘all eternal decks’ quase integralmente (lá está, um disco em que soam mais do que nunca como banda e que tem a produção que as bandas têm – e as canções estão lá todas na mesma e ‘it grows on you’). Mais umas quantas coisas pelo caminho (‘broom people’ foi muito bom; ‘wake up new’ também). Mas o que eu queria mesmo era falar dos dois encores. Foi assim: ‘this year’; ‘no children’; ‘the best ever death metal band in denton’; ‘the sign’ (sim, a dos ace of base); ‘southwood plantation road’ e ‘going to georgia’. Acho que está tudo dito.
Gabo muito as capacidades de quem faz isto. Registar tudo, ficando imóvel.