quinta-feira, 7 de julho de 2016
o papel do Renato
Sei de uma equipa que jogava um futebol desgarrado, feito de cruzamentos sem nexo e de remates com pouco critério. Nos idos de outubro, para essa equipa, tudo parecia perdido. Até que chegou um puto, 18 anos acabados de fazer, pegou na bola, levou-a em cavalgadas emocionantes meio-campo acima e o que não fazia sentido adquiriu uma coerência que poucos vislumbravam. Em maio, arrastada pela energia contagiante desse número 8, essa equipa sagrava-se campeã, contra todas as expectativas. A equipa era o Benfica e o jogador, Renato Sanches.
Talvez poucas coisas definam de forma tão exata a ambição desmedida de Renato como uma declaração que li de um ex-treinador seu nas camadas jovens do Benfica. Tendo encontrado o Bulo no Seixal, ainda antes de se estrear na equipa A, perguntou-lhe: "Renato, quando é que vais jogar?". A resposta saiu pronta: "Mister, não sei quando é que vou jogar, mas, quando jogar, não saio mais."
Avancemos no tempo. Euro 2016, a Seleção arrasta-se em campo, empata, amarrada a um jogo burocrático. Depois, entra o Renato e com a inconsciência que o carateriza, contagia os colegas e a seleção quase parece outra. O Renato que assume um penálti logo a seguir ao Cristiano, mas, também, o Renato que, como o Cristiano, está sempre de braço erguido a pedir a bola. Ao ponto de, no fabuloso golo contra a Polónia, ter escolhido rematar, em lugar de passar ao Cristiano que, de braço no ar, pedia a bola.
Entrou e não mais vai sair. De tal forma que, hoje, se pode dizer que a Seleção é o Ronaldo, o Renato e mais nove. O melhor que podia ter acontecido a Portugal.
publicado no Record de quarta-feira