Quem se senta nas bancadas do Estádio da Luz sabe bem
como, ao longo de sete anos, Óscar Cardozo dividiu os adeptos. Não
passava um jogo sem que se escutassem críticas pela lentidão com que o
paraguaio jogava; pela forma como, alegadamente, estragava a nota
artística do jogo ofensivo do Benfica; ou pelo sem número de
oportunidades fáceis desperdiçadas. Ora, raro era o jogo em que Cardozo
não silenciava os críticos, marcando golos atrás de golos. Temo bem que,
nos próximos tempos, os mesmos que não se cansaram de criticar o
Tacuara chorem e lamentem a sua ausência.
O futebol, como o resto da vida, é muito ingrato. No
caso de Cardozo parece-me, contudo, que era algo mais do que isso que
esteve sempre em causa. Criticar o paraguaio era revelador da
incapacidade de muitos para compreender um jogo de futebol e, acima de
tudo, esquecer o essencial. Cardozo era lento, sim, é verdade, mas
digam-me um jogador com a sua estatura que não o seja; Cardozo falhava
muitos golos, pois sim, na exata medida em que criava para si muitas
oportunidades; Cardozo prejudicava a nota artística, talvez – mas o que
conta no futebol é quem marca mais golos, e o paraguaio estava lá para
isso, com um registo que fala por si (e que não será ultrapassado nos
próximos tempos).
Para mim, Cardozo é, no entanto, mais do que isso. É o
avançado perigoso, que provocava medo nos adversários, e que marcava
golos, com o seu pé esquerdo canhão e infalível, enquanto eu formava os
meus filhos no benfiquismo. Sei que para o Vicente e para a Leonor, o
Cardozo vai ser o que para mim foram o Filipovic e o Nené. Uma memória
inicial dos golos do Glorioso. Também por isso fico-lhe agradecido para a
vida.
(resposta à questão, "vai ter saudades de Cardozo?", publicada ontem no Expresso Digital)