"O futebol é uma chatice. É um pretexto para as
pessoas estarem juntas, para os pais e os filhos não terem que enfrentar
o grande silêncio." Disse-o ao ‘Público’ Sérgio Oksman, realizador de
"O Futebol", que passou há dias no DocLisboa. O filme, esse, é
desconcertante: conta a história de um pai e de um filho apartados vai
para duas décadas que combinam reencontrar-se no Brasil, para assistir
ao Mundial.
Ao longo de 70 minutos, não se vê
uma única bola em movimento ou um jogador. A câmara fixa pai e filho a
acompanharem jogos em cafés, do lado de fora do estádio e até num
hospital. O que conta é a sugestão de que a fragilidade dos laços
familiares e dos afetos paternais tem nos jogadores e no jogo formas de
aproximação sentimental. O futebol para enfrentar a ausência e o grande
silêncio.
Desculpem-me o regresso à derrota
do Benfica às mãos do Sporting, mas estive em Alvalade nos 7-1 e sei que
não devemos contornar as experiências traumáticas, temos de
enfrentá-las. Neste trauma que ainda está bem vivo, a meio do jogo, o
meu filho, que nos anos que leva de bancada da Luz nunca havia visto
nada assim, disse-me, meio a medo, "não quero estar aqui". Expliquei-lhe
que não se abandona as bancadas antes do fim.
É
uma questão de princípio e uma experiência formativa. Sem a sensação
singular de vivermos as derrotas e de deixarmos que elas se entranhem,
não sofreríamos da mesma forma pelo nosso clube. Mais importante, com as
vitórias e os abraços emocionados nos golos, está claro, quebramos o
silêncio, aproximamo-nos. Já nas derrotas dolorosas, aprendemos a sofrer
em conjunto. O que faz muita falta no resto da vida que fica fora dos
estádios.
publicado no Record de terça-feira