O futebol pode bem ser a continuação da política por outros meios, 
pelo que a história do Euro se confunde com a da Europa: em 1960, ano da
 primeira Taça das Nações Europeias, apenas quatro seleções participaram
 na fase final. Dos três primeiros classificados, nenhum país existe e 
da sua fragmentação nasceram dezenas de novas nações. A União Soviética 
venceu a Jugoslávia na final, enquanto a Checoslováquia derrotava a 
França no jogo para o 3º lugar. Três repúblicas socialistas e uma 
potência colonial – que, entretanto, também, perdeu o seu império. 
Nas décadas seguintes, a integração europeia progrediu, o Bloco de 
Leste colapsou e a democracia chegou ao sul. O futebol europeu 
beneficiou da revolução cultural dos 60. Num torneio já com uma fase 
final alargada, a Laranja Mecânica liderada por Cruyff, ainda que nunca 
cumprindo as expetativas, mudava a face do futebol europeu, questionando
 as regras estabelecidas. Depois, perante a desagregação política a 
Leste e o alargamento da U.E. às jovens democracias, o multiculturalismo
 tomava conta das seleções, que juntavam filhos de emigrantes de todas 
as proveniências. A Europa respirava otimismo histórico e o futebol 
espelhava o ar dos tempos.
Hoje, o Euro é de novo retrato da Europa. Uma competição alargada 
para além do razoável (24 seleções!), num continente fragmentado, 
dividido por novas clivagens e movido a ressentimento. Regressaram em 
força os confrontos entre adeptos, as tensões nacionalistas e até a 
Alemanha – que no fim tenderá a vencer – se revela, em campo, uma 
potência hegemónica relutante.
publicado no Record de 13 de Junho
