"I hope the fences we mended
Fall down beneath their own weight"

John Darnielle

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quinta-feira, 16 de abril de 2009

A falsa consciência de Zé Pedro

Sobre a música dos Xutos de que se fala, o texto mais conseguido que li foi o editorial de hoje do Público, de Nuno Pacheco. O argumento é simples e parece-me encerra a discussão: o grupo já veio dizer que a música não visava em concreto este primeiro-ministro, mas, a crer no Público, isso pouco importa, pois o que conta é a apropriação social que, em cada momento, é feita das músicas ("na relação das canções com o meio social, é sempre este último que dita a palavra definitiva"). Daqui decorre um corolário: mesmo canções que não foram concebidas com um determinado objectivo, podem adquiri-lo se o "meio social" assim o entender. As tais canções que "acabam por se tornar veículos de coisas com que os seus autores nem sequer sonharam". Este é, para Nuno Pacheco, o caso da canção dos Xutos, "pensem os Xutos o que pensarem" (sic).
Se bem estou recordado do Marx que aprendi na faculdade e está claramente muito enferrujado, uma determinada posição de classe decorre das condições materiais de existência, mas como as visões dominantes (a ideologia, que tem uma conotação pejorativa) são as da classe dominante, a um determinado lugar de classe podem corresponder visões que configuram uma falsa consciência. Daí que a única acção política consequente seja a que rompe com a infra-estrutura (i.e. as condições materiais), levando a que a um lugar de classe corresponda à consciência de classe adequada.
É tal e qual isto que se está a passar com o Zé Pedro. Ele bem que pode vir negar o sentido da música e até vir dizer que, com naturais reservas, apoia José Sócrates. Mas que não restem dúvidas. A Voz do Povo reconstruída é que sabe: a falsa consciência de classe do Zé Pedro justifica as declarações que tem procurado fazer nos últimos dias; mas as condições materiais de existência é que explicam, de facto, a música. Aliás, suspeito mesmo que o Zé Pedro é portador da transformação social, mesmo que não tenha consciência. Vai-se a ver, ele próprio é dispensável.