"I hope the fences we mended
Fall down beneath their own weight"

John Darnielle

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quinta-feira, 7 de maio de 2009

Há, de facto, muita tolerância com o PC

Um amigo chamou-me a atenção para as declarações de hoje no parlamento do deputado comunista Bernardino Soares, onde este qualificou as palavras do deputado socialista Mota Andrade como estando “ao nível das de um destacado militante do PS, [que,] na pele de comentador, até se atreveu a dizer que tem havido demasiada tolerância com o PCP na sociedade portuguesa”. Tendo depois acrescentado que “se vivêssemos no tempo do fascismo, eram uma boa carta de recomendação para integrar os quadros da PIDE”. As citações são da Lusa e tomo-as por verdadeiras.
O comentador sou eu e de facto na sexta-feira na RTP-N disse que há muita tolerância na sociedade portuguesa com o PC. A frase foi dita perante a a recusa que o PC demonstrou ao longo do dia em se distanciar dos agitadores (que se combinou com as twittadas do deputado Miguel Tiago, que, entre outras pérolas, escreveu que “Vital Moreira é que agride os trabalhadores portugueses há muito tempo!” (sic)). Em momento algum esteve em causa outra responsabilidade do PC que não a de, ao contrário dos outros partidos, não ter criticado o que aconteceu. Mas se fossem necessárias mais provas da tolerância que se tem com o PC, aí estão as declarações de Bernardino Soares hoje.
Vamos ver se nos entendemos: as democracias pluralistas assentam num chão comum, que tem necessariamente de ser partilhado por todos. O problema do PC é mesmo esse: divide-se entre a hesitação na defesa e a secundarização de princípios basilares da democracia, à cabeça o pluralismo, o respeito pelos direitos humanos e pela liberdade de expressão. Basta ter lido as teses ao último congresso onde o PCP defendia o “papel de resistência à “nova ordem” imperialista” dos países que definem como “orientação e objectivo a construção duma sociedade socialista – Cuba, China, Vietname, Laos e R.D.P. da Coreia” e onde revelava uma nostalgia despudorada da U.R.S.S – “a contribuição da URSS e, posteriormente, do campo dos países socialistas, para os grandes avanços de civilização verificados no século XX foi gigantesca” para se perceber a consideração que o PC tem por esse chão comum. Sobre votos de fé na democracia, estamos, por isso, conversados. Façamos um paralelismo com o que aconteceria se um qualquer partido de direita português se lembrasse de tecer um elogio equivalente a qualquer regime autoritário. Suspeito que ninguém, e a meu ver bem, toleraria. Pois ao PC tudo é permitido, desde logo a escalada de crescente ortodoxia em que se tem embrenhado e que é tomada como uma idiossincrasia nacional, meio patusca. De facto, é preciso ter muita tolerância com os intolerantes.
Há uma fonte de legitimação democrática à qual o PC recorre sempre que se vê em apuros – o anti-fascismo e a corajosa resistência de muitos comunistas ao regime de Salazar. 35 anos depois, aí reside o capital democrático dos comunistas portugueses. É isso, aliás, que permite, por exemplo, que o PC se ache dono e senhor do 25 de Abril e do 1º de Maio, momentos em que outros democratas são autorizados a juntarem-se aos comunistas. Nada disto é novidade, mas é uma tendência que se tem acentuado nos últimos tempos. Nem sequer é preciso voltar ao “caso Vital Moreira”. Basta recordar como José Neves – a quem todos os que em Portugal defendem uma sociedade pluralista devem de facto muito – foi também apupado este ano nas comemorações do 25 de Abril.
Bernardino Soares, que há uns tempos tinha “dúvidas que a Coreia do Norte não fosse uma democracia”, resolveu hoje dizer que as minhas declarações “eram uma boa carta de recomendação para integrar os quadros da PIDE”. De facto, há muita tolerância com o PC, desde logo, porque a afirmação é de tal modo insultuosa que só é tolerável porque vivemos numa democracia, onde temos de tolerar principalmente os intolerantes.